- Isso não tira. Então a tia julga que só os tolos fazem versos?
- Tolos não digo, mas...
- Mas um pouco feridos na asa, não é verdade?
- Ora pois então diz-me tu, menino, se um homem sério... sim... um homem de respeito faz versos.
- Porque não?
- Versos?!
- Versos, sim, senhora.
D. Doroteia fez um gesto de incredulidade.
Henrique ia a redarguir, quando ouviram passos no patamar de pedra da entrada e, após, algumas pancadas à porta da sala.
- Abra, tia Doroteia - disseram de fora as vozes de Madalena e de Cristina, que foram logo reconhecidas.
E cedo depois entravam alegremente na sala, em companhia de D. Vitória, que vinha mais retardada.
D. Doroteia levantou-se para recebê-las.
- Bons dias ou boas tardes, tia Doroteia, porque me parece que já jantaram. Vimos aqui para confiar aos seus cuidados a tia Vitória, que não nos quer acompanhar a ouvir a palavra eloquente do missionário - disse a Morgadinha.
- Eu não; para apertos e barafundas é que não estou.
- E tu vais, Lena? - perguntou D. Doroteia.
- Então? Não quero passar por impenitente. Ainda não o ouvi.
Pode crer? Além de que percebi na Criste um fervor, com o qual quis condescender.
- Dizem que prega tão bem - atalhou Cristina.
- Pois pregará, mas eu é que já não estou para sermões - ponderou D. Vitória.
- Vou eu também ouvir o missionário - disse Henrique, levantando-se. - Já mo mostraram há dias. Se os dotes oratórios do homem corresponderem à figura...
- Então? - interrogou D. Doroteia.
- É um homem gordo e vermelho, de pulso grosso e, em geral, tipo da grossura do pulso.
- Pois bom é que vás, menino - disse D. Doroteia - para acompanhares as pequenas.
- Como quiser, primo - acudiu Madalena - mas não se constranja.