Cedo ouviu um estrondo... Quando os abriu, estava por terra a faia.
- Agora é a tua vez, pobre carvalho! - dizia algum tempo depois - Muito queria minha mãe àquela árvore! Por suas mãos a plantou bem tenra. Nunca me sentei àquela sombra, que me não lembrasse da santa mulher! Parecia que eram vozes tuas, que ma recordavam, infeliz! Bárbaros! Olha com que desamor a decepam! Perdoa-me, meu velho amigo, mas bem vês que te não posso valer.
E o carvalho caiu.
- Ei-los agora contigo, cerdeira. Mal adivinhavas tu, quando o ano passado te enfeitavas com aquelas cerejas escarlates, que tanto cobiçavam as crianças, que pela última vez o fazias!... Adeus, pobre amiga, adeus.
E caía a cerdeira também.
E caíam, uma após outra, todas as árvores do quintal: os limoeiros, as nogueiras, os salgueiros e toda a família vegetal do velho Vicente, que sentia ir-se-lhe com ela a alma. Memórias de infância, sonhos de juventude, e reminiscências de velho, como aves invisíveis, ocultas nas copas daquelas árvores, surgiam agora, espavoridas e desnorteadas, a procurar o refúgio que não encontravam fora dali.
Por outro lado os delicados sentimentos do ervanário eram dolorosamente feridos, ao desmoronarem-se as paredes daquela pequena casa, onde ele envelhecera e contava morrer, e ao patentear- se indiscretamente aos olhos irreverentes e curiosos do povo aquele recatado asilo.
A demolição prosseguia com ardor e actividade. Em pouco tempo, só restavam da casa os muros, meio derrocados; e, no quintal, a serra e o machado principiavam a exercer no tronco da última árvore a sua obra destruidora. Era o castanheiro da entrada, gigante de outro século, que desafiara os raios de muitos invernos sucessivos.
A exaltação do ervanário cresceu naquele momento.