A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 25: XXV Pág. 384 / 508

Para o Oriente haviam-se fundido os nimbos em uma massa única, uniforme, cerrada, como uma abóbada metálica, cujo livor imitava. De quando em quando cruzava os ares uma ave de voo rápido, soltando pios angustiosos.

Era a esta hora que devia efectuar-se o enterro de Ermelinda.

Estava já aberto o jazigo da família do conselheiro, aguardando a infeliz criança.

Os padres cantavam na igreja, e o sino repicava, como de festa, saudando a entrada de mais uma alma sem culpas no grémio dos anjos.

À porta da igreja no adro e no cemitério estacionavam alguns ociosos; muitos acercavam-se do sepulcro, movidos pela curiosidade que a nova forma de enterro lhes suscitava.

As murmurações, conquanto menos manifestas aqui do que na taberna do Canada, nem por isso faltavam.

Até da porta da igreja para dentro, até de joelhos, até de contas na mão e olhos fitos no altar, os murmuradores existiam. Velhas beatas clamavam assim a justiça celeste sobre os ímpios do século, que não queriam enterrar-se no chão sagrado da igreja. Junto da pia da água benta, aspergindo-se, persignando-se sobre a boca, para que Deus as livrasse de pecar por palavras, nessa mesma ocasião, elas entoavam os seus trenos e maldiziam dos reformadores, sobre quem chamavam as penas do Inferno.

Havia também no grupo alguns que conferenciavam em voz baixa e se entreolhavam de maneira misteriosa, fitando às vezes os caminhos próximos, como se dali aguardassem alguma coisa.

A Morgadinha viera junto ao túmulo despedir-se da filha do Cancela.

Cristina ficara a fazer companhia a D. Vitória, que se achara adoentada.

Segundo o costume de algumas aldeias, Ermelinda devia ser acompanhada à campa por crianças quase da mesma idade, vestidas como para festa. Uma delas era a pequena Mariana, a irmã mais nova de Cristina; as outras, raparigas das vizinhanças, que as senhoras do Mosteiro tinham por suas próprias mãos vestido e enfeitado.





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