Cristina ficou a chorar na varanda.
A Morgadinha veio, sem ser sentida, abraçá-la, dizendo:
- Pago-te hoje o abraço que me deste no outro dia; mas eu escuso de te perguntar: «Pois tu amava-lo?»
- Ai, Lena!... - exclamou Cristina, cada vez chorando mais.
- Faltava aos vossos amores este arremedo de infelicidade, e imaginarem uma separação de duzentos passos para poderem representar a cena das despedidas, e chorarem como Paulo e Virgínia.
Impostores! - dizia Madalena, para consolá-la.
Em Alvapenha, Henrique passou horas de intensa melancolia.
Impacientavam-no as conversas de sua tia e de Maria de Jesus, a qual tais mudanças notava nele, que chegou a aventar à ama a ideia de que a doença tinha transtornado o juízo ao rapaz, opinião que D. Doroteia levou muito a mal.
Outro sintoma que se manifestou em Henrique foi a indignação que lhe causou a carta de um amigo que, com o maior cepticismo, lhe perguntava novas dos seus hábitos pastoris e das Tirses e Galateias que o traziam enlevado. Henrique revoltou-se desta vez, com todo o fogo do coração, contra aquele tom frio e sarcástico da epístola, e nem lhe respondeu.
Depois teve Henrique uma visão.
Não se assustem os leitores que antipatizam com o maravilhoso.
Nada há aqui que se pareça com as visões épicas; foi uma visão como muitas, que nós todos, uma ou outra vez na vida, experimentamos; um desses espectáculos que nos prepara de quando em quando a imaginação, esta fértil e poderosíssima criadora, que nos acompanha incessantemente. A quem não terá, de facto, sucedido ver transformar-se pouco a pouco uma perspectiva, desvanecerem- se os efeitos da visão exterior, enfraquecerem as impressões dos sentidos, e avultarem, tomarem forma, realidade, vida, as imagens de uma mais íntima, espontânea e misteriosa visão? Estava Henrique à janela do quarto que habitava em Alvapenha.