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Cristina, corando, retirou a mão de que Henrique se apoderou, e, levantando-se sobressaltada, disse:
- Julgo que são horas do seu remédio. Vou preparar-lho.
E fugiu, correndo em direcção de casa.
Cenas mais ou menos análogas a esta reproduziam-se todos os dias durante a convalescença de Henrique. Reinava o idílio e uma como perfumada atmosfera, que exercia profundas revoluções no carácter de Henrique e de Cristina. Ele ia perdendo de dia para dia aquelas exterioridades artificiosas que Madalena por tanto tempo combatera em vão; ela, Cristina, ganhando vida, actividade, sofrendo uma dessas metamorfoses análogas às da vida de borboletas; da infância, estado de crisálida para a imaginação, passara à verdadeira juventude, ao período em que a imaginação ganha asas, em que o coração se completa.
Desde que Henrique se achava em estado de passear, não havia razão plausível para permanecer no Mosteiro; portanto tornou-se inevitável a mudança para Alvapenha.
Já se não fez sem lágrimas a despedida.
Choraram as crianças, chorou D. Vitória e a própria Madalena se sentiu comovida; só Cristina não se achava na sala em que se passou a cena.
Encontrou-a Henrique no patamar da escada por onde tinha que sair.
Seria casual esta circunstância? Henrique não perguntara por Cristina; dizia-lhe o coração que a encontraria ali.
- Volto à minha solidão, Cristina - disse-lhe, comovido. - Não lhe tinha eu dito?
A pobre menina quis sorrir, mas do esforço que para isso fez só lhe resultaram lágrimas.
- Não diga mais nada - disse Henrique, levando aos lábios a mão, que ela não retirou. - Essas lágrimas bastam-me.
Escusado é dizer que estas palavras mais lágrimas produziram.
E Henrique desceu do patamar com a vista enevoada por elas.