E a tia, muito zangada, mandou-o calar.
- É verdade que sim. Com certeza estava aqui um anjo escondido em qualquer parte.
- E Mrs. Harper contou-lhe então que o Joe a tinha queimado com uma bicha de rabiar e a tia contou-lhe o que se tinha passado com o Peter e o estimulante.
- Exactamente assim, tão certo como eu estar aqui.
- Depois conversaram um bocado a respeito da dragagem no rio para
nos procurarem e dos ofícios fúnebres de domingo. Então a tia e Mrs. Harper abraçaram-se a chorar antes de ela sair.
- Passou-se tudo como tu dizes. Se tivesses estado presente não poderias contá-lo melhor. E em seguida que aconteceu?
- Pareceu-me que a tia estava a rezar por mim, porque a vi ajoelhar e ouvi as palavras que disse. Fiquei tão triste, que, quando se deitou, escrevi num bocado de casca de sicômoro: «Não morremos; fugimos para irmos ser piratas.» Pus isto em cima da mesa ao pé do candeeiro, mas, quando olhei para a tia, curvei-me e beijei-a.
- Tu fizeste isso, Tom? Tu fizeste isso? Perdoo-te tudo só pelo que fizeste! - declarou, agarrando-o e abraçando-o com tal força que o rapaz se sentiu o mais criminoso dos vilões.
- Foi uma grande bondade, mesmo não passando de sonho! - resmungou Sid de maneira que o pudessem ouvir.
- Caia-te, Sido Uma pessoa faz em sonhos aquilo que era capaz de fazer acordada. Aqui está uma maçã, Tom, que guardei para te dar, se alguma vez aparecesses. Agora vai para a escola. Voltaste e por isso dou graças a Deus, nosso Pai, que sofreu tanto e perdoou àqueles que O acreditaram e à Sua palavra. Talvez eu não mereça toda a Sua bondade, mas se só os que a merecem tivessem a ajuda da Sua mão nas horas difíceis, poucos haveria neste mundo que sorrissem ou que viessem a entrar no Seu reino quando chegasse a noite final. Vão-se daqui, filhos. Vão; Sid, Mary e Tom, que já me estorvaram de mais.
Os pequenos saíram para a escola e a tia Polly apressou-se a ir ter com Mrs. Harper, com a intenção de deitar por terra o seu realismo contando -lhe o sonho maravilhoso de Tom. Sid teve o bom senso de não dar a perceber o que pensava ao sair de casa e que era isto:
- Não acredito lá muito num sonho tão comprido e tão certo. Tom estava agora transformado num herói. Não ia a correr nem a saltar, mas sim com ar digno, como compete a um pirata que se sente o ponto de mira do público. Era-o de facto e, embora fizesse o possível por fingir que não via os olhares que o seguiam nem os comentários feitos à sua passagem, tudo isto era para ele um prazer.