Foi, pois, a luz de um dia esplêndido e a brisa, cheia de aromas, que vem dos campos nas alvoradas serenas, que penetraram no quarto de Henrique, quando ele abriu as janelas.
A inesperada surpresa quase lhe soltava do peito uma exclamação de prazer! A aldeia, aquela mesma aldeia, escura e triste, que, com o coração apertado, atravessara na véspera, parecia outra.
O sol da manhã baixara sobre ela, dissipara-lhe as sombras, colorira-lhe as verduras, reflectira-se-lhe nas presas, dispersara-se em íris cambiantes na espuma das torrentes e cascatas naturais, perfumara-a de aromas, animara-a de cantos, transformara-a, enfim, na mais risonha paisagem em que os olhos de Henrique, pouco habituados às esplêndidas galas do Minho, tinham nunca repousado.
O Inverno despojara parte dessas galas, embora! Até da própria nudez de algumas árvores resultavam encantos. As folhas crestadas, os ramos despidos, as moitas sem flores infundem tristeza; mas não tem a tristeza poesia também? Pode haver completa paisagem onde não haja uns tons escuros de melancolia? Henrique de Souselas, debruçado na varanda de pedra do quarto, não se cansava de admirar aquela cena.
Parecia-lhe estar assistindo a um milagre de fadas, que, num momento, se elevam, nos ermos, jardins e paços como os de Armida e Alcina.
Pois era esta a mesma aldeia, através da qual ele cavalgara de noite? Os acidentes do terreno, aqueles acidentes, que tão do fundo da alma amaldiçoara na véspera, produziam, vistos então dali, os mais pitorescos efeitos.