Na manhã do dia seguinte estava toda a família de Madalena, na qual incluímos já D. Doroteia e Henrique, reunida em uma das salas do Mosteiro.
As duas primas, Madalena e Cristina, trabalhavam em costura; Ângelo e Henrique jogavam o xadrez; D. Doroteia e D. Vitória conversavam a respeito do preço de umas meadas de linho, que esta tinha dado a corar, e da péssima qualidade do fiado, efeito evidente, segundo D. Vitória, das criadas que tinha, que nem para fiar serviam. O conselheiro examinava distraído vários memoriais e cartas de empenho, que recebera já a pedir empregos e graças em paga dos serviços eleitorais, às vezes hipotéticos.
A cada passo, porém, Madalena suspendia o trabalho, para olhar para a porta da sala, principalmente quando nos imediatos aposentos se escutava algum rumor; ou trocava olhares com Ângelo, que não com menor frequência os desviava das pedras do tabuleiro para encontrar os da irmã.
Henrique também, de quando em quando, tinha que perguntar a Cristina, e esta, para lhe responder, julgava-se obrigada também a afastar os olhos da costura.
D. Vitória e D. Doroteia não era raro meterem-se na conversa dos outros, donde fácil transição achavam logo para voltarem aos seus assuntos favoritos: meadas e criados.
O conselheiro interrompia a cada momento a leitura com bocejos, ou fazia notar alguma mais exorbitante pretensão de tantas que examinava.
Era evidente que todas aquelas cabeças estavam pouco preocupadas com os assuntos aparentes das suas cogitações.
- Ó Lena! - dizia Cristina, que pela terceira vez chamava a prima, sem conseguir ser ouvida - que tens tu esta manhã? Que distracções são essas, que não respondes quando te chamam?
- Pois falaste-me?
- É o que eu digo! Ó menina, há que séculos te estou eu a perguntar em que tempo é que as laranjeiras têm flor?
- Ah! Criste! - acudiu o conselheiro, do lado, sorrindo.