A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 11: XI Pág. 165 / 508

- Pois é verdade - dizia ele - fomos todos da mesma criação.

O conselheiro Manuel Berardo saiu daqui para Lisboa um ano depois de eu ir para o Brasil. Andámos ambos na mesma escola, que era a do Padre Joaquim, ali pelo sítio da Corredoura. Vossemecê, há-de estar lembrado, Sr. Luís - acrescentou, dirigindo-se, com a afabilidade protectora que o caracterizava, a um dos lavradores.

- Ora se estou! muito bem. Era na casa em que hoje mora o Chico da Luciana.

- É verdade que sim. Pois ali andei eu e o conselheiro e aquele ratão do Vicente, ervanário, que era já rapaz taludo. Lembra-me, como se fosse hoje, de quando jogávamos todos três a pedra no terreiro da Corredoura.

- Olha lá, hem! - diziam dois lavradores com um sorriso cortesão nos lábios - Então com que o Sr. Seabra também jogava a pedra! Eh! eh! eh!...

- Ora, como um homem. Eu fui levadinho da breca. Boa sova levei de minha mãe, por causa de umas calças novas que rompi.

- Ora vedes! - diziam os outros.

- Ai, tempos, tempos! - disse, suspirando, o Brasileiro.

- Quem havia de dizer então ao que V. S.ª e o conselheiro tinham de chegar! - notou lisonjeiramente o Sr. Bento Pertunhas.

- Eu sim - respondeu com toda a sua modéstia o Brasileiro.

- A que cheguei eu? Comi candeias acesas pelo Brasil, para arranjar um bocado de pão para o resto da vida; com isso me contento. O mais, sou um pobre diabo que ninguém conhece, um homem ignorante, sem princípios. Ele é outra coisa.

- Não é tanto assim - insistiu Pertunhas. - Todos sabem que V. S.ª, se quisesse...

- Olhe, meu caro amigo, eu conheço-me; se tivesse o juízo de muitos, que por aí vejo figurando, então havia de me ver na brecha; porque, não é por me gabar, mas não me tenho por menos do que muitos deles.





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