A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 20: XX Pág. 316 / 508

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- Meu pai, não diga isso! Não fale assim, que é pecado.

- Cala-te! Que grande, maior pecado fizeste tu, afligindo assim teu pai! Os missionários! Quem lhes deu o direito? Quem lhes ordenou? Deus? Se Deus é assim, se Deus quer estas crueldades... Deus não é Deus, e eu não o reconheço, nem adoro!

Ermelinda tremia de terror, ouvindo estas palavras, que a irritação e o desespero estavam ditando ao pai. A tímida e nervosa criança horrorizava-se ouvindo aquelas frases audaciosas e quase blasfemas, e a cada momento esperava ver cair um raio fulminador a castigá-las.

- Por amor de Deus! - murmurava ela, com a voz chorosa e quase sumida - por alma de minha mãe!...

- Cala-te! Não fales em tua mãe, que não mereces dizer esse nome! Tua mãe! Aquela sim, que sabia como eu lhe queria; que sempre lidou para me não causar penas, e que só com a sua morte me fez chorar lágrimas tão amargas e tantas, como eu choro agora!

E chorava cada vez mais, chorava, como um fraco, aquele homem forte e valente, chorava, porque tinha um coração de pai.

Ermelinda lançou-se-lhe nos braços, cobrindo-o de afagos e de beijos.

- Perdoe-me, meu pai! Perdoe-me! - dizia ela. - Se soubesse... Fui eu que pedi... Fui eu que sonhei... Não chore assim, meu pai! Não culpe ninguém; fui eu, eu que pedi a minha madrinha!... Foi por a salvação da minha alma, porque...

- E foi tua madrinha que tos cortou?

- Foi, mas... É que o missionário tinha dito... O missionário é um santo!... Não olhe para mim desse modo, meu pai, que me faz medo.

E cobria os olhos com as mãos, para não ver a expressão do rosto do Cancela.

- Querem matar-me a filha! - bradava ele. - Ó meu Deus! Pois não é isto um grande pecado? Fazer da criança, linda e alegre, que eu deixei





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