A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 21: XXI Pág. 328 / 508

Cedo ouviu um estrondo... Quando os abriu, estava por terra a faia.

- Agora é a tua vez, pobre carvalho! - dizia algum tempo depois - Muito queria minha mãe àquela árvore! Por suas mãos a plantou bem tenra. Nunca me sentei àquela sombra, que me não lembrasse da santa mulher! Parecia que eram vozes tuas, que ma recordavam, infeliz! Bárbaros! Olha com que desamor a decepam! Perdoa-me, meu velho amigo, mas bem vês que te não posso valer.

E o carvalho caiu.

- Ei-los agora contigo, cerdeira. Mal adivinhavas tu, quando o ano passado te enfeitavas com aquelas cerejas escarlates, que tanto cobiçavam as crianças, que pela última vez o fazias!... Adeus, pobre amiga, adeus.

E caía a cerdeira também.

E caíam, uma após outra, todas as árvores do quintal: os limoeiros, as nogueiras, os salgueiros e toda a família vegetal do velho Vicente, que sentia ir-se-lhe com ela a alma. Memórias de infância, sonhos de juventude, e reminiscências de velho, como aves invisíveis, ocultas nas copas daquelas árvores, surgiam agora, espavoridas e desnorteadas, a procurar o refúgio que não encontravam fora dali.

Por outro lado os delicados sentimentos do ervanário eram dolorosamente feridos, ao desmoronarem-se as paredes daquela pequena casa, onde ele envelhecera e contava morrer, e ao patentear- se indiscretamente aos olhos irreverentes e curiosos do povo aquele recatado asilo.

A demolição prosseguia com ardor e actividade. Em pouco tempo, só restavam da casa os muros, meio derrocados; e, no quintal, a serra e o machado principiavam a exercer no tronco da última árvore a sua obra destruidora. Era o castanheiro da entrada, gigante de outro século, que desafiara os raios de muitos invernos sucessivos.

A exaltação do ervanário cresceu naquele momento.





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