A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 22: XXII Pág. 345 / 508

como de quem deseja e receia, ao mesmo tempo, fazer uma alusão - a vingança, bem ou mal fundada, obriga, às vezes, os mais nobres caracteres a uma acção baixa e vil; entre os que por mim se possam julgar ofendidos, é natural encontrar o criminoso».

- Esclareça-me este mistério! - disse Madalena, consternada.

- De que se trata aqui?

- Alguma correspondência política extraviada. Seu pai diz bem; é necessário descobrir o traidor por cautela. Além de que, para todos os que como eu têm entrada nesta casa, é isto um mistério em que a nossa honra está empenhada, porque V. Ex.ªs têm direito a alimentar suspeitas.

- Por amor de Deus! - acudiu, interrompendo-o, a Morgadinha.

- Não pronuncie essa palavra! Suspeitas! Esse envenenamento moral, que eu até aqui não conhecia, quer meu pai que voluntariamente o contraia.

- Seja envenenamento, muito embora, mas é um envenenamento salvador, prima, como o da vacina; é um preservativo de traição.

- Viver para desconfiar! Procurar nas palavras que se ouvem um sentido oculto! Nos gestos uma expressão denunciadora! Nos afectos uma intenção egoísta! Oh! Isto é horrível! Mas... que carta é essa, meu Deus? Que correspondência pode ter meu pai, que não deva ver a luz do dia? Meu pai!... Há por força ilusão nisto! Meu pai não tem crimes; meu pai não tem acções que o envergonhem; meu pai pode franquear a todos as portas da sua casa sem recear-se de indiscrições. Pois não é assim?

- Por certo, prima, mas... na política há actos que... sem serem criminosos...

- A política! Sim, é isso! Eu devia prever que essa palavra viria para explicar este mistério! Por política é-se cruel, por política sacrifica-se um amigo, por política força-se a consciência, e depois... ela justifica tudo. Que obras





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