A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 22: XXII Pág. 358 / 508

Enquanto Augusto assim lutava consigo mesmo, D. Vitória dizia:

- Agora é que eu entendo o que queria dizer o primo Henrique. Sempre é um homem que sabe o que é o mundo...

Ao ouvir estas palavras, Augusto arrojou de si o periódico, e cintilou-lhe o olhar, de cólera:

- Ah! Foi ele? Sim... Havia de ser. Devia suspeitá-lo. Era de esperar que o fizesse. É o pretexto. Minha senhora, há aqui uma traição infame, uma traição que eu não ousaria suspeitar de ninguém! Mas juro-lhe que...

- Há-de dar-me licença de ir acomodar meus filhos - disse D. Vitória, interrompendo-o friamente. E encaminhou-se para a porta.

Augusto viu-a afastar-se, e disse-lhe em tom sereno, mas comovido.

- Vá, minha senhora, vá; mas, se tem a essas crianças amor de mãe, não lhes ensine por ora a suspeitar de um homem que elas se tinham habituado a amar e a venerar. Peço-lhe por elas, mais do que por mim. É uma triste e prematura experiência que lhes vai dar; vai-lhes envenenar para toda a vida o coração e talvez que contra si mesma veja voltar-se a desconfiança que lhes semeia tão cedo.

D. Vitória saiu da sala sem lhe responder; é certo, porém, que não ousou dizer aos filhos coisa alguma em desfavor do mestre. Sob as singularidades do génio daquela senhora havia um fundo de bom-senso, onde perfeitamente calaram as reflexões de Augusto.

É singular: ao entrar na sala imediata, ia a limpar os olhos, comovida.

Augusto permaneceu abatido e desalentado, como se naquele momento tivesse visto dissiparem-se todas as esperanças da sua vida. Lágrimas inflamadas e amargas assomaram-lhe aos olhos ao ver-se humilhado no seio de uma família que ele respeitava, da família daquela a cujos olhos mais desejaria nobilitar-se, engrandecer- se, revestir-se de todos os prestígios.





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