A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 25: XXV Pág. 393 / 508

Ao chegar, porém, ao meio do círculo, que conseguiu romper, e quando ia a dirigir a palavra a Madalena, reparou para o cadáver da criança do esquife, o qual continuava inda pousado no chão; fitou os olhos naquela pálida e serena fisionomia, inda animada pelo mesmo sorriso de inocências, e, apesar da débil claridade da hora, reconheceu a filha.

Nem um só grito de dor lhe saiu dos lábios, nem um só movimento de surpresa; ficou mudo, imóvel, com os olhos fitos naquela criança morta, com as mãos juntas e com as faces extremamente pálidas.

Perante esta terrível manifestação de dor, que toda se concentra, para num momento gastar mais vida do que o perpassar de muitos anos, calmaram todos os outros sentimentos que dominavam os corações.

Fez-se um profundo silêncio. O Herodes, numa espécie de recolhimento fervoroso, ajoelhou junto do caixão de Ermelinda, e, trémulo, oprimido, quase sem alento para chorar, aproximou a medo as mãos das mãos cruzadas da criança.

Ao primeiro contacto retirou-as rapidamente por achá-las de gelo; mas, tomando-as outra vez, murmurava:

- Jesus, meu Deus! Está morta!... Ermelinda!... Filha!... Isto não pode ser, Senhor!... Pois minha filha está morta?

A paixão principiava enfim a manifestar-se mais tumultuosa; mas havia no tom de voz, com que estas palavras foram pronunciadas, não sei quê tão intimamente doloroso, que pressentia-se que, no curto espaço de tempo que as precedera, se tinha operado naquele peito uma revolução tremenda, como se uma íntima dilaceração o tivesse destruído. Adivinhava-se lá dentro já um desalento mortal, um mal de que se não convalesce nunca. Aquele homem estava perdido.

- Mataram-me a minha pobre filha! A minha Ermelinda... Que mal lhes tinha eu feito para ma matarem?.





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