Aumentava-se-lhe com tudo isto a funda melancolia que já lhe tomara o ânimo.
- Tantas fadigas para este resultado? - pensava ele. - Sair de Lisboa para me enterrar nesta aldeia escura e suja! Enganou-se o parvo do doutor. Cuidava que me salvava e matou-me. Eu morro por certo aqui. Deus lhe perdoe o homicídio.
Os caminhos sucediam-se aos caminhos, qual mais tortuoso e incómodo de trilhar; as curvas complicavam-se como as ruas de um labirinto. Aqui subiam; desciam mais além, para subir outra vez.
Umas vezes caminhavam em terreno descoberto, outras penetravam em tão estreitas quelhas, apertadas entre paredes argilosas e húmidas e toldadas de ramos entrelaçados, que só o instinto do animal podia evitar-lhes os perigos. Ora soavam as patas do macho como em chão lajeado, ora amortecia-lhe o som um terreno, que a chuva encharcava, e a água lamacenta vinha salpicar o rosto do cavaleiro.
As casas eram já frequentes, e algumas de menos humilde aparência.
Os cães, que, pelo timbre de voz, mostravam ser gigantes, ladravam raivosos por dentro dos portões ou de sobre os muros das quintas, ao ouvirem os passos da cavalgadura ou a voz do almocreve, que falava ou cantava sempre.
Outras vezes era um inarmónico grunhir suíno que acusava a vizinhança das cortes ou, partindo de um casebre rústico, o chorar de crianças, entremeado com os ralhos das mães e com as pragas dos chefes de família.
O almocreve não desistira das suas funções de cicerone, que somente interrompia para saudar alguns conhecidos seus, a cuja porta passavam.
- Estes campos e lameiros - ia dizendo - são da Morgadinha dos Canaviais; andam arrendados a um compadre meu.