A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 18: XVIII Pág. 273 / 508

Em ocasiões de festa levanta-se em qualquer terreiro ou pátio de quinta um tablado; vêm adorná-lo as mais vistosas colchas de chita, das quais também se formam os bastidores; alugam-se nos depósitos mais modestos da cidade ou vila próxima vestidos de reis, de príncipes e de guerreiros, em que se combinam os elementos de épocas e de nacionalidades disparatadas, e, perante uma plateia rústica, ao ar livre, como no teatro antigo, desafiam-se em cantada choradeira as sentimentais peripécias da vida de qualquer santo, ou, entre gargalhadas, os episódios cómicos de algum enredo popular.

A circunstância de ser o auto desta vez desempenhado no pátio do Mosteiro, o que fora em parte por deferência ao deputado do círculo, em parte por conveniência dos empresários, pela apropriação do terreno a todos os efeitos, e pela ajuda de custo, que sempre em tais casos recebiam de S. Ex.ª, essa circunstância, dizemos, aumentava o número de espectadores.

Das janelas do Mosteiro gozava-se, como de um camarote de frente, do espectáculo popular.

O terreiro era destinado para o povo, em grande parte atraído também pela pipa de vinho, que o conselheiro nestes dias mandava pôr à disposição dos seus representados.

Desde a véspera havia grande agitação e azáfama no pátio do Mosteiro. Os artífices levantavam o tablado cénico; pregavam e despregavam tábuas; serravam barrotes; os directores, e à frente deles o infatigável e imaginoso Pertunhas, davam ordens contraditórias; e os curiosos estacionavam em magotes, dificultando tudo, censurando o que viam fazer, e aventando alvitres absurdos.

Herodes, o pai de Ermelinda, andava em brasas. Aproximava- -se a hora dos seus triunfos. O génio dramático palpitava nele, cheio de vida e de entusiasmo.

Ia





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