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Capítulo 18: XVIII

Página 274
mais uma vez poisar nos ombros o manto da realeza judaica; brandir a espada infanticida, carregar aqueles sobrecenhos com que fazia chorar as crianças e estremecer as mães; ia ressuscitar Herodes, o déspota legendário.

Trabalhando e suando, resmoneava os versos do seu papel de tirano e insensivelmente fazia gestos e esgares prometedores de efeitos cénicos futuros.

Os seus colegas eram menos ardentes pela arte. O Herodes olhava- -os com a sobranceria de um Talma, e muitas vezes lamentava sinceramente a ausência de vocações dramáticas que auxiliassem a dele.

E não sorriam os leitores a esta veleidade artística do recoveiro; ali havia fundamentos para ela. O Cancela era o minério de um trágico, deixem-me assim dizer. No meio de uma escória de rusticidade continha abafado mineral de lei.

Tivessem sido outras as contingências da sua vida, vê-lo-iam porventura arrebatar plateias inteiras com as revelações do génio, que, às vezes, num grito, num sorriso, num gesto se manifesta; mas, ainda assim inculto, não mentia nele o verdadeiro entusiasmo, o sentimento da arte que lhe afogueava as faces e os olhos e lhe animava o gesto no calor do desempenho; não mentia aquela embriaguez que lhe causavam os aplausos da multidão. Não há verdadeiro génio artístico, que se não namore do público, embora o saiba caprichoso, inconstante e ingrato. O homem, indiferente aos aplausos das turbas, nunca será poeta nem artista de verdadeira inspiração. O amor vivo da glória adianta a meio caminho os empreendedores desta nova conquista de velocino.

Ermelinda, essa, tremia com a comoção de artista novel, à lembrança do espectáculo, em que pela primeira vez ia entrar.

As senhoras do Mosteiro, ou antes, Madalena e Cristina, tinham querido encarregar-se da toilette da Fama.

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pág. 274 (Capítulo 18)

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Capa do livro A Morgadinha dos Canaviais
Páginas: 508
Página atual: 274

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I 1
II 15
III 32
IV 49
V 68
VI 81
VII 95
VIII 113
IX 127
X 144
XI 160
XII 176
XIII 192
XIV 206
XV 226
XVI 239
XVII 252
XVIII 271
XIX 292
XX 309
XXI 324
XXII 339
XXIII 361
XXIV 371
XXV 383
XXVI 397
XXVII 404
XXVIII 416
XXX 440
XXXI 463
XXXII 476
XXXIII 487
Conclusão 506