De repente voltou-se, porque ouviu atrás de si uns passos conhecidos.
Era Ermelinda, que voltava para casa. O pai ficara atrás a pôr em ordem as roupas e mais objectos que serviram no auto.
- Esperava por ti, Ermelinda, para te dizer adeus - disse Ângelo.
- Então vai embora?
- Vou amanhã - respondeu Ângelo, com a voz presa de comoção.
- Muito cedo?
- De madrugada.
Os dois calaram-se por algum tempo, olhando para o lado.
- E agora quando volta?
- Eu sei lá, agora... só para Agosto.
Novo silêncio.
- Então... adeus...
- Adeus... adeus... Adeus, Ermelinda.
E com a voz quase sumida e os olhos enevoados de lágrimas, Ângelo estreitou contra o peito aquela que de pequena tratara como irmã, e que chorava ainda mais do que ele.
Que melancólico fim de dia tão alegre! A este tempo uma sombra escura passou por eles e estacou.
Ermelinda! - disse logo a voz esganiçada e colérica, que saiu daquele vulto.
Ermelinda estremeceu ao ouvi-la.
Era a mulher do Zé P’reira, que voltava das suas devoções e ficara surpreendida com o espectáculo que vira. A assustadiça castidade daquela matrona toda se alvoroçou com a tocante despedida das duas crianças.
Ermelinda aproximou-se, a tremer, da madrinha, que rudemente a agarrou pelo braço e a levou consigo.
Ângelo esteve quase resolvido a ir tirar das mãos daquela harpia a inocente vítima; mas a chegada de Herodes estorvou-o.
A Sr.ª Catarina do Nascimento de S. João Baptista ia dizendo, ao levar consigo a afilhada:
- Que terão ainda de ver meus olhos, meu Divino Pai do Céu? Que mundo este de abominação, meu doce Jesus! Ó Virgem das Dores, isto é para se ver e não se crer! Uma criança, uma criança de dois dias, se pode dizer, e já assim com a alma perdida! Ó meu Jesus crucificado!.