Não queremos. Já disse!
- Eu não lhes reconheço o direito de querer.
- Ora o padre-mestre tem vagares! - disse o façanhudo Cosme - e tu pachorra para escutá-lo, João. Para isto não foi que viemos. Sermões para a Quaresma. Vamos! Cante lá os seus responsos e latinório, e ande-me para a igreja. Vamos nós fazer o enterro. Ó Manuel coveiro, traze a enxada e vem daí.
E, dizendo isto, o Cosme já se abaixava para levantar o caixão em que jazia Ermelinda.
- A justiça de Deus caia sobre o ímpio, que com as mãos impuras tocar nesse cadáver, que está abençoado pela Igreja! - exclamou o velho, indignado e com um metal de voz vibrante e terrível.
Na aldeia os homens mais endurecidos não são superiores à intimação religiosa. O Cosme retirou a mão, como se receasse que a imprecação do padre se cumprisse ali mesmo.
Houve uma momentânea quebra no furor popular; um destes momentos de hesitação, que tão fatais são ao êxito das revoluções democráticas; ninguém se sente com coragem de erguer o novo grito, e quase todos procuram esconder-se, como envergonhados já do primeiro ímpeto.
Mas a primeira onda não é a mais temível; os primeiros bandos populares, que saem à rua, soltando o grito de revolta, são ingénuos no meio da sua quase selvagem ferocidade; entregues a si, cedo espontaneamente se dariam por vencidos; fácil seria subjugálos. Mas, quando esses poucos momentos, em que tumultuam sem pensamento que os dirija, não são os precisos para ficarem esmagados sob a repressão do poder; quando o grito sedicioso, em vez de sacrificar estes revolucionários, quase cândidos, mandados por os cautos para tentar a oportunidade da ocasião, aparenta surtir efeito, ou porque satisfaz uma aspiração legítima das massas, ou porque lisonjeia um falso