Cedo se adiantaram para o altar, e claramente se reconheceu serem Cristina e Torcato.
Caminharam silenciosos até o altar principal. Torcato subiu os três degraus, sobre que este ficava elevado, e acendeu duas velas de cera que, em enegrecidos castiçais de madeira dourada, ornavam uma imagem da Virgem da Soledade. Espalhou-se no recinto uma froixa claridade, que não dissipou as sombras dos recantos, nem as que se condensavam no tecto.
Cristina fez sinal então a Torcato, para que se retirasse; e o velho, com os passos arrastados e tossindo, caminhou para a porta, que dentro em pouco se ouviu gemer sobre os gonzos e fechar-se com estrondo.
Tudo ficou depois em silêncio.
Cristina então ajoelhou diante daquela imagem, que era a de que a tradição popular contava milagres, e em profundo recolhimento ficou imóvel a rezar a devoção prometida.
Henrique de Souselas sentia-se enlevado por esta cena. Aquela angélica criatura viera ali agradecer à Virgem o tê-lo salvado! Aquele anjo amava-o! Havia, pois, no Mundo quem o amasse com um amor puro e cândido, em que ele já nem acreditava. E cabia-lhe a suprema ventura de gozar um amor assim! Madalena via com alegria a comoção de Henrique.
A oração de Cristina prolongou-se por alguns minutos.
Henrique murmurou, juntando as mãos:
- Deus te recompense, anjo, a consolação que me dás.
- Não peça a Deus o que está na sua mão - respondeu-lhe em voz baixa Madalena.
- Que diz?
- Está ou não sinceramente apaixonado?
- Como nunca imaginei que fosse possível estar.
- Crê na pureza daquele coração?
- Como na dos anjos.