Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 2: II Pág. 19 / 519

E era esta a cena que Jorge contemplava, e que em tão profundas meditações parecia absorvê-lo. De repente, distraiu-o o som dos passos de alguém que se aproximava daquele mesmo lugar, em que tão desapercebidamente lhe ia correndo a manhã.

Voltando-se, viu o seu irmão Maurício, que em traje rigoroso e competentes petrechos de caça, e com a esmerada elegância e apuro que lhe eram habituais, subiu a colina, precedido de dois ou três cães de boa raça, que de longe descobriram Jorge e correram para ele, afagando-o, com latidos e cabriolas.

Maurício, assim avisado e conduzido pelos cães, veio ter com o irmão, exclamando jovialmente à distância de alguns passos:

- Em flagrante delito de meditação poética, o Sr. Jorge! Bravo! Já não desespero de te ver um dia fazer versos.

Jorge respondeu, encolhendo os ombros:

- Quem se senta no alto de um monte, depois de subir toda a encosta dele sem parar, pode fazê-lo simplesmente com o prosaico intento de tomar fôlego. Se isto fosse sintoma de poesia, então…

- Pois sim, mas já isso de subir ao monte com as mãos vazias, como estás, sem uma espingarda que revele um razoável fim no passeio, é um sintoma importante. Quem é que se dá ao incómodo de uma ascensão dessas, quando o gozo da perspectiva que espera encontrar-lhe não compensa as fadigas? E quem tem dessas compensações senão os poetas, que são os únicos que sabem

ce qu’on entend sur la montagne?

Avez-vous quelque fois, calme et silencieux,

Monté sur la montagne en présence des cieux?

E, a recitar os primeiros versos da poesia aludida, sentava-se ao lado do irmão, pousava a espingarda e, descobrindo a cabeça, sacudia aos ventos os formosos e bastos cabelos castanhos, objecto de muitos cuidados seus.





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