XXXV Como homem a quem pesava a comissão que se propunha a desempenhar ali, Tomé da Póvoa, depois de cumprimentar o fidalgo e de abençoar a filha, foi direito ao fim da sua visita.
- Pois, Sr. D. Luís, eu venho aqui para buscar a rapariga se V. Ex.ª der licença.
Berta desviou para o fidalgo um olhar inquieto e investigador.
D. Luís não respondeu, mas correu-lhe pelos lábios um rápido sorriso, entre amargo e irónico.
Tomé, em vistas do silêncio do fidalgo, sentiu que não podia deixar de dizer mais algumas palavras de explicação, e por isso, enleado a forjar um pretexto que não lhe ocorria, acrescentou:
- Ela está sendo lá precisa... porque... sim, a minha Luísa, pelos modos... anda assim adoentada...
- Minha mãe está doente? - perguntou Berta com inquietação.
- Doente, doente... o que se chama doente, não digo, mas... E depois há lá uns milhos a arrecadar e os pequenos... E enfim, nesta época do ano, a casa de um lavrador... Os jornaleiros são muitos...
E a cada pretexto que mal apontava, Tomé erguia a vista para D. Luís a estudar-lhe na fisionomia o efeito da desculpa.
Mas de todas as vezes a achava cerrada na mesma expressão de reserva e de mistério.
De repente, porém, D. Luís fez um movimento, como se uma súbita resolução lhe acudisse, estendeu a mão para Berta, que se demorava ainda ao lado dele, e como que a impeliu de si e na direcção de Tomé, dizendo com afectada placidez:
- Aí a tem. Pode levá-la.
À estranheza com que Tomé o encarou, vendo-o fazer aquele gesto, correspondeu o fidalgo acrescentando em tom de amargura e sarcasmo:
- Não calculou bem o tempo. Antecipou-se. A ocasião não era ainda esta; por ora não estou enfeitiçado, bem vê.
Tomé julgou perceber vagamente o sentido destas palavras e corou dizendo:
- Ou eu entendo mal o fidalgo, ou quer dizer.