XIX O antigo solar da família da baronesa, chamado a Casa dos Bacelos, como que ao despertar de um sono de muitos anos, abrira à luz do dia as suas amplas janelas, reacendera o fogo nos lares apagados, e restaurara o movimento e a vida nos aposentos vazios.
Era a primeira vez, depois do seu casamento, que a baronesa voltava aos sítios onde lhe correra a infância, cujas suaves memórias ainda os povoavam. Ao ver de novo aquelas velhas paredes e aquelas árvores frondosas, ao seguir pelos extensos corredores, ao penetrar nas espaçosas salas e nos mais retirados gabinetes da casa, Gabriela, ainda que pouco propensa a melancolias, não pôde subtrair o espírito a uma impressão de saudade.
Vestígios mal apagados daquele tempo longínquo a cada passo lho relembravam; ali fora o teatro dos seus brinquedos e jogos, além estava um objecto ao qual se prendia a reminiscência de uma provação infantil, aquele era o lugar favorito de seu pai, acolá desenhava-lhe vagamente a sua recordação a imagem da mãe, que perdera em criança, e, dominada por esta influência, Gabriela suspirava e conhecia que ainda não morrera de todo em si o coração provinciano.
Mas uma tal disposição de espírito não podia durar muito. A baronesa era uma mulher de acção, e não se esquecia que tinha muito em que pensar e que fazer em virtude dos acontecimentos últimos da Casa Mourisca.
Não eram somente as canseiras de dona de casa que deseja acomodar convenientemente os seus hóspedes que a preocupavam, mas também, e mais ainda, o desejo de restituir àquela família a harmonia tão inesperadamente interrompida e de conciliar o irritado fidalgo com o filho, que pelo seu nobre proceder incorrera no desagrado do velho. Gabriela tomara deveras a peito esta pacificadora empresa; mas para isso era ainda cedo.