Ilíada - Cap. 23: Capítulo 23 Pág. 117 / 178

Mas Glauco, ainda amargurado com a morte de Sarpedão, aproximou-se de Heitor e disse-lhe com desprezo:

—Não te envergonhas, Heitor, de fugir assim ao combate? Como é que hás-de defender a cidade só com o auxílio dos teus guerreiros? Já nenhum lício tem incentivo para combater os gregos, pois tu pouco te importas com a sorte dos teus aliados! Não deixaste abandonado o cadáver de Sarpedão, teu hóspede e teu amigo, para que o inimigo dele se apoderasse e o levasse como presa de guerra? Ele, que tudo sacrificou para salvar Tróia e a ti próprio! E tu nada ousaste, nada fizeste para, ao menos, o preservar dos cães! Por esses motivos, se os Ikios me ouvirem, ir-nos-emos todos embora e Tróia verá chegar os seus últimos dias. Se fosses mais corajoso e intrépido, já há muito que estaríamos de posse do cadáver de Pátroclo. Então, os gregos se prontificariam a entregar-nos os despojos de Sarpedão em troca dos de Pátroclo. Mas não! Tu tiveste medo de Ájax e não aceitaste o combate frontal porque ele é mais valente do que tu.

De cenho carregado, Heitor respondeu:

—Porque me censuras, Glauco? Sempre te considerei meu amigo e pensei que me conhecias o bastante para não duvidares da minha coragem. Bem sabes que não receio o combate, pois já tenho dado boas mostras de valentia e audácia nesta guerra. Mas é preciso não esquecer que a vontade de Júpiter sempre se realiza e foi ele quem me impediu a fuga. Entretanto, não te vós e observa o que vou fazer. Verás então se sou cobarde.

E, dizendo isto, gritou para que os homens, que levavam a armadura de Pátroclo, se detivessem. Despojando-se então das suas armas e da sua couraça, revestiu-se com as de Aquiles, que ele próprio arrebatara a Pátroclo.





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