Depois de levar os troianos até àquela conjuntura, Júpiter deixou-se ficar lá pelos altos do monte Ida, indiferente ao que se passava na terra. Estava certo de que nenhum deus se arriscaria mais a desobedecer às suas ordens.
Entretanto, Neptuno, o deus do mar, que tinha uma predilecção especial pelos gregos, andava muito aborrecido com a vitória dos troianos. Não conseguindo conter-se por mais tempo, resolveu aproveitar a distracção de Júpiter e, descendo do cume donde assistia a tudo, mandou atrelar o seu carro de ouro puxado por dois cavalos de paras de bronze e crinas douradas. Vestiu-se também de ouro, subiu para o carro e, dentro de alguns instantes, mergulhava no oceano e chegava-lhe ao fundo. Todos os monstros e habitantes marinhos saudavam o rei à sua passagem. Chegando a uma caverna profunda e ampla que lhe servia de cavalariça, desatrelou os cavalos, deu-lhes a ração divina e amarrou-os com fortes cordões de ouro. Em seguida, marchou em direcção ao exército grego.
Os troianos, guiados por Heitor, avançavam sempre, com a impetuosidade do fogo e a força da tempestade.
Pretendiam incendiar os navios gregos ainda naquele dia. Mas Neptuno, tomando a figura e a voz de Calcas, o profeta, meteu-se entre os combatentes gregos e começou a encorajá-los. Dirigiu-se aos dois Ájax e disse-lhes:
— Ficai firmes e não penseis em fugir. Sois naturalmente os mais fortes e tendes de salvar o exército. Por mim, não receio os troianos, apesar de serem comandados pelo invencível Heitor. Ide até onde ele se encontra, obrigai-o a recuar e estou certo de que um deus vos protegerá.
Enquanto falava, Neptuno tocou nos dois guerreiros com o seu ceptro de ouro e eles encheram-se de coragem. As pernas pareciam-lhes mais ágeis e os braços mais fortes. Quando procuraram o falso Calcas para lhe responder, já não o encontraram. Apercebendo-se daquele súbito desaparecimento Ájax, filho de Oileu, disse ao outro: