Berta respondeu já serenamente:
- Creio que não é, porque não pode decerto haver intenção de ofender-me em quem entra em minha casa na companhia do Sr. Maurício. Ele bem se lembra de que eu fui em pequena a companheira de sua irmã Beatriz, de que sou a afilhada de seu pai, e naquela casa, a que ele pertence, julgo que ainda há, como dantes, muito respeito por estes laços de família e de amizade...
- Há, Berta, há, e tão santo como em outros tempos. E há mais, há a firme resolução de os fazer respeitar aos outros, como lá se respeitam.
- Abranda-te, leão! Não estou disposto a lutar contigo, apesar desses olhares ferozes. Esta menina far-me-á mais justiça, reconhecendo que eu não a ofendi...
- Não falemos mais nisso - acudiu Berta, friamente.
- Mas é um caso de consciência - insistiu o abade.
- Então ninguém tão habilitado para o decidir como um sacerdote - tornou-lhe Berta, com desdém.
Gargalhada do mano bacharel.
- Chucha! Ora mete-te com ela, anda.
- Em coisas de coração - redarguiu o padre, galanteadoramente - são melhores juízes do que os sacerdotes as madamas.
Berta contraiu a fronte com desgosto e respondeu-lhe com maior severidade:
- Quando elas têm um pai, podem eles também ser juízes. E o meu aí vem.
Efectivamente chegava Tomé da Póvoa.
O honrado fazendeiro, que tinha a sua opinião formada a respeito dos fidalgos do Cruzeiro, franziu o sobrolho, assim que os avistou com a filha.
Nem a presença de Maurício bastou para tranquilizá-lo.
Tomé conhecia de pequenos os rapazes da Casa Mourisca e sabia até que ponto se podia contar com o que em Maurício havia de bom, e recear do que nele havia de mau.