Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 17: XVII Pág. 227 / 519

Este inesperado brinde produziu grande sensação. A parte moça da companhia, prevenida como estava, principiou a sufocar os risos e a falar ao ouvido dos vizinhos; os velhos abriam os olhos espantados ou indignavam-se com o desconchavo de brindar uma família plebeia depois de outras de tão apurada raça. A consequência foi que ninguém correspondeu ao brinde, e os cálices ficaram intactos na mesa. Seguiu-se um silêncio profundo na sala.

O primo do Cruzeiro, sem se intimidar, perguntou:

- Então que é isto? Ninguém me secunda?

E corria a vista em redor da mesa com expressão irónica, que, a seu pesar, se desvaneceu ao encontrar a vista de Jorge, que, pálido de íntima comoção, também se erguera e levantara o cálice para responder:

- Secundo eu, primo, - disse ele, com um leve tremor de voz - e creia que da melhor vontade o faço. Brinda-se a uma família honrada, laboriosa e justa. A ninguém deve repugnar o brinde, e muito menos a mim, a quem motivos particulares obrigam a venerá-la.

- Ah! - murmurou provocadoramente o padre, sentando-se com ares de vitória.

Um meio sorriso passou por os lábios de alguns espectadores da cena.

- Levante-se! - ordenou Jorge ao padre com intimativa. - Ouça-me de pé, que eu também estou de pé para secundar o seu brinde.

É singular! O padre ergueu-se, como se não pudesse resistir ao olhar indignado e imperioso de Jorge.

- Repito, - continuou este - brindo aquela família honrada, porque é honrada e porque motivos particulares me levam a venerá-la. E para lhes não dar ocasião de sorrirem outra vez, ou de afagarem a víbora venenosa, que aí soltaram, eu lhes explico as minhas palavras. Se ouvirem verdades que lhes firam o orgulho de fidalgos, lancem a culpa da vexação a quem mas provocou.





Os capítulos deste livro