Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 18: XVIII Pág. 240 / 519

Por isso calou-se, o que aumentou o mau humor que já trazia acumulado.

- A casa do Tomé da Póvoa! - resmungava ele. - O homem está doido! Ora isto! E eu a aturá-lo! O que me estava reservado!

A intenção com que o fidalgo demandava a casa do fazendeiro era um mistério indecifrável para o espírito do procurador.

Tinham descido a encosta a meio da qual se erguia a Casa Mourisca. Aproximavam-se da ponte que atrevessava o vale. A tarde ia no fim. Era já a claridade do crepúsculo que iluminava a paisagem. A azáfama do trabalho acalmara. Nos marcos dos campos, à soleira das portas e nos parapeitos das pontes repousavam finalmente os lavradores das fadigas do dia. O gado caminhava para as presas, conduzido por crianças de seis e sete anos.

Nos arvoredos ouvia-se um cantar de aves, tímido como ele é ao aproximar do Outono e ao aproximar da noite. Era tal a serenidade da tarde, que se percebia o sino duma freguesia distante dobrando a finados.

A suave melancolia daquela hora influiu no ânimo de D. Luís. Que densidade de tristeza a que pousou naquele coração! Saudades, mas saudades escuras de velhice, saudades de quem não tem futuro, era o que havia naquela alma. Com o passado tinham-lhe ido todos os objectos das suas crenças, do seu amor, das suas afeições. Já não era capaz de entusiasmo, e os olhos em que o entusiasmo não influi vêem tristemente coloridas todas as cenas da vida. Ao desencantamento do presente juntavam-se as apreensões pelo futuro a entenebrecer-lhe o espírito. Era deveras infeliz aquele velho!

Depois da ponte seguiu-se a colina, onde prosperava a Herdade de Tomé. D. Luís reuniu alento para subi-la.

O padre aventurou outra observação:

- Sr. D. Luís, eu não atino com as razões que trazem V. Ex.ª aqui, mas não vejo que possa resultar bem algum de semelhante visita.





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