Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 257 / 519

- Suponho, sim, senhor; e suponho mais, suponho que V. Ex.ª bem sabe quando e de que maneira me insultou. Porque era preciso não ter brios para imaginar que um homem de bem não se ofenderia com acções como as de V. Ex.ª para comigo.

- Ora essa! - comentou D. Luís, voltando-lhe as costas e caminhando desdenhosamente para a janela.

Tomé da Póvoa, a quem este movimento aumentou a excitação de que já estava possuído, deu alguns passos mais agitados para o seu orgulhoso interlocutor.

O fidalgo, sentindo-o, voltou-se subitamente e encarou-o fixo.

- Vem aqui decidido a alguma violência, ao que parece.

A irritação de Tomé desvaneceu-se. O olhar de D. Luís parecia avivar-lhe memórias do tempo, em que se costumara a obedecer-lhe e a temê-lo quase.

A reflexão venceu esta timidez de instinto; contudo foi menos agressivo do que até aí que ele respondeu:

- Não, Sr. D. Luís; venho aqui decidido a explicar-me. É preciso que fiquemos ambos sabendo o que um e outro somos. Não posso por mais tempo sofrer calado os desprezos e as desfeitas de V. Ex.ª, sem perguntar qual o motivo que dei para elas. Palavra de honra, Sr. D. Luís, que por mais que me mate, não posso ver em toda a minha vida uma só acção, uma única, que me merecesse da parte de V. Ex.ª este procedimento para comigo; não posso.

- Está sonhando, Tomé? Cuida que eu não tenho mais em que pensar do que em desfeiteá-lo? Que mania se lhe meteu na cabeça!

- E que foi senão uma desfeita o que V. Ex.ª me fez no outro dia, indo à porta de minha casa entregar nas mãos da minha própria filha as chaves do seu palácio, que deixou só porque eu havia adiantado ao Sr. Jorge um pouco de dinheiro por um contrato honesto e leal? Que foi aquilo senão uma desfeita?

- Se não compreende os motivos que me levaram àquele passo, não sei que lhe faça.





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