Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 3: III Pág. 27 / 519

Dá cá um ancinho, que eu vou arredando esse folhelho.

No meio deste fogo cerrado de ordens, de conselhos e de observações, foi Tomé da Póvoa interrompido pela voz da mulher, que exclamou:

- Ai, ó Tomé, olha quem ali está!

O fazendeiro voltou-se e deu com os olhos em Jorge, que do portão do quinteiro viera, cumprindo o que tinha dito ao irmão, contemplar o mesmo espectáculo que tanto o havia atraído ao observá-lo da colina.

Era raro que os filhos de D. Luís visitassem a Herdade. O velho fidalgo ainda se não costumara à prosperidade do homem que fora seu criado. A granja era como que uma censura pungente à sua imprevidência; era uma lição muda que ele recebia a todos os momentos, que o humilhava no seu orgulho e pungia-lhe o coração de remorsos.

Tomé não se mostrava soberbo nem insolente, antes conservava por a família da Casa Mourisca, e principalmente por D. Luís, certa deferência e respeito, que se ressentiam ainda da passada posição do fazendeiro em casa do fidalgo.

Este, porém, procurara o primeiro pretexto para interromper as relações com Tomé. Uma questão de águas, ocasionada por abertura de uma mina em terrenos da Herdade, serviu-lhe para o intento. D. Luís, sempre indiferente a litígios dessa ordem, mostrou-se então muito cioso dos seus hipotéticos direitos, e, não obstante a nenhuma animosidade que houve da parte do lavrador, desde essa época nunca mais conviveu com ele.

Jorge e Maurício, que costumavam frequentar a casa do homem que os trouxera ao colo e que lhes queria deveras, receberam ordem para não voltarem lá.

Tomé da Póvoa sentiu-se com este proceder, que não tinha merecido; mas possuía bastante finura para perceber a verdadeira causa da irritação do fidalgo; por isso limitou-se a encolher os ombros, dizendo para a mulher:

- Então que queres tu que eu lhe faça? Assim nasceu, e assim há-de morrer.





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