- Ai, para o Sr. regedor!
- É verdade.
- Então a S. Ex.a tenciona tomar estado?
- E vamos lá saber,- informou-se o doutor - a rapariga é arisca ou acessível?
- Por ora parece-me desconfiada apenas, mas...
- Como disseste que se chama? Berta?
- Sim.
O padre cantarolou:
Berta, Berta, meus amores,
Berta do meu coração,
És a rainha das flores.
Trai lari lari larão.
E, cantando, trepava o muro de um pomar para colher laranjas que de lá o estavam seduzindo.
- Deixa lá as laranjas; anda daí - dizia o mano doutor, que seguia à frente do rancho.
- A casa do cidadão é inviolável - acrescentou Maurício.
- Sim, senhor,- tornou o padre, já a cavalo no muro - mas, se me faz favor, nem isto é casa, nem um homem que mora na aldeia é cidadão.
E saltou do muro com a sua colheita, e pôs-se a caminho, comendo as laranjas que roubara.
- Então dá cá uma- disse o doutor, voltando-se para trás.
- Ah! ah! já cobiças?
E o padre arremessou duas laranjas, que o mano destramente aparou nas mãos.
A companhia foi seguindo pelos acidentados caminhos da aldeia, cantando, saltando, pondo em confusão as lavadeiras moças que ensaboavam nas presas, abraçando à força na estrada as raparigas que, vergadas sob molhos de erva ou de milho cortado, mal lhes podiam fugir; visitando todas as tabernas, fazendo correrias a galinhas, porcos ou vacas, se se lhes deparavam na passagem, calcando campos e escalando muros com o desassombro de senhores.
Maurício imitava-os meio constrangido, mas imitava-os. Se às vezes os seus melhores instintos ou a influência do trato com Jorge o faziam conter, a reflexão maliciosa de qualquer dos primos, que ironicamente lhe celebrava a candura, impelia-o a vencer a primeira hesitação, e afinal dava o passo que lhe repugnara.