Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 18: XVIII Pág. 238 / 519

Quando o procurador, a fim de suavizar as agruras do desterro, pretendia fazer transportar algum objecto que podia ser de utilidade para melhor acomodação da família, o fidalgo ordenava-lhe secamente que o deixasse ficar, o que cada vez mais exasperava o padre.

Vendo que tudo estava pronto, D. Luís deixou por alguns instantes o procurador na sala e subiu vagarosamente as escadas que conduziam aos antigos aposentos da filha que perdera.

Ao penetrar ali, que doloroso estremecer o do coração do velho! Ia desamparar também aquele quarto! Esta ideia só poderia fazer vacilar-lhe a inabalável coragem! Era um lugar de recolhimento aquele para o desconfortado ancião. Tudo ali dentro se conservava como no fatal dia em que ela morrera. Todos os objectos que haviam pertencido à infeliz criança ali se guardavam religiosamente. E ia deixá-los! O leito, o genuflexório, o toucador, a harpa, parecia possuírem uma voz para falar-lhe dela. E havia de fugir-lhes! A coragem, porém, não soçobrou na luta. D. Luís fechou discretamente a porta para si; depois com fervorosa comoção beijou quase um por um esses diferentes objectos, e, ao chegar junto do leito, o mesmo em que a vira adormecer do último sono, ajoelhou soluçando, e cobriu de beijos e de lágrimas as almofadas onde tantas vezes se encostara a pálida cabeça da sua Beatriz.

Mais tranquilo depois desta efusão de dor, ergueu-se, enxugou os olhos e desceu com a mesma lentidão as escadas até o portal, onde o padre o esperava já com impaciência e inquieto pelo adiantado da hora.

Um criado segurava pela rédea os cavalos que deviam transportá-los.

- Vamos, vamos, Sr. D. Luís, olhe que apanha a noite na estrada e os caminhos não são lá essas coisas - exclamou o padre aflito.

D. Luís, em vez de responder-lhe, disse para o criado que segurava os cavalos:

- Vai esperar-nos na baixa do Paul.





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