Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 2: II Pág. 24 / 519

Deves confessar que há mais poesia nos domínios senhoris dos lordes de Inglaterra, que dirigem por si mesmos as suas vastas empresas agrícolas, do que nos pardieiros em ruínas dos nossos morgados, em cujas velhas salas dormem os proprietários o sono da ignorância, da inutilidade e da devassidão.

- Não o nego, mas… na nossa casa, naquela triste Casa Mourisca, há um quê de poesia, da poesia elegíaca, se assim quiseres. Essa de que falas será a poesia das geórgicas; mas a da elegia deixa-ma ficar.

- O pior, Maurício, é que um dia virá talvez em que o tremendo prosaísmo da completa miséria dissipará esse ténue perfume que dizes.

- Safa! Estás hoje com uns humores de cassandra, Jorge! Deixa lá; lembra-te de que se diz que nas nossas propriedades há um tesouro escondido desde o tempo dos mouros, e que um dia alguém de nossa família o achará, ficando fabulosamente rico. Que essa esperança dissipe o humor negro que tens. Vamos, vem daí. Pega nesta espingarda e vai caçar. É bom para dissipar visões.

- Não estou hoje para caçar.

- Então vais reatar aqui o fio das tuas cogitações?

- Não, vou reatá-lo acolá.

- Vais à Herdade?

- Vou.

- Fazer o quê?

- Ver de mais perto aquela poesia, ou aquela prosa, como quiseres.

- Sabes que o pai não gosta que lidemos muito de perto com o Tomé?

- Sei. É um preconceito. Ele não o saberá.

- Um preconceito! Bom! Estás hoje muito filósofo. Adeus, Jorge; espero ver-te ao jantar de melhor aspecto.

- Adeus, Maurício.

E os dois irmãos separaram-se. Maurício, precedido pelos cães, seguiu em direcção dos montes, cantando. Jorge desceu a colina e caminhou para a Herdade.





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