Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 20: XX Pág. 263 / 519

Tomé prosseguiu mais exaltado:

- Deixe-me crescer e medrar, fidalgo, que as minhas plantações, para terem viço, não vão roubar o suco das suas terras. Não é por isso que elas estão maninhas, não. E se quiser ofuscar-me, deixe seu filho Jorge empregar o talento, a honestidade e o amor ao trabalho que deve a Deus em tornar a sua casa no que ela foi em outros tempos. Então sim, então terá razão o orgulho de V. Ex.ª, porque ninguém será mais para louvar e admirar do que o moço que der um tal exemplo, a criança que se fez homem para trabalhar, e o fidalgo que se fez lavrador para salvar a sua casa, e que por isso não deixou de ser fidalgo, antes mais do que nunca mostrou que o era. Este orgulho entende-se; mas há um de má casta que se parece muito com a inveja.

A esta última palavra D. Luís não conteve um movimento de violência.

- Basta. Desde que principia a ser insolente, não devo escutá-lo. Talvez tenha feito mal em ouvi-lo tanto tempo. Do motivo das minhas acções só tenho a dar contas a Deus. A si, basta que lhe diga que não recebo essas chaves, nem volto para a Casa Mourisca, enquanto não estiverem saldadas as minhas contas consigo.

- Comigo! E sempre comigo! Pois bem: teima em ofender-me?... Aceito as chaves, levo-as para casa. Mas faço-lhe aqui, eu também, um protesto, fidalgo. Juro que hei-de, a seu pesar, fazer-lhe o bem que puder. Se os meus socorros o humilham e envergonham, há-de ter a paciência de se humilhar e envergonhar por muito tempo, porque de hoje em diante vou trabalhar como nunca na restauração da sua casa. Ah! cuida que é só desfeitear-me e eu calar-me envergonhado? Enganou-se. Enganou-se. Enganou-se. Apre! Eu também tenho vontade. Há-de ver com quem se meteu. Ainda que o fidalgo quisesse agora dar cabo do que lhe resta, eu lhe juro que não o conseguiria.





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