Luísa ficou compreendendo que os projectos de restauração da Casa Mourisca haviam sido pelo menos adiados, e com isto cresceu nela a admiração pelo carácter de Jorge.
Maria Luísa tinha durante aquela manhã recebido impressões que não se atrevia a revelar totalmente ao marido, mas que a não deixavam estar sossegada enquanto não transpirassem em vagas insinuações.
Estavam à janela os dois esposos, conversando placidamente de Jorge e de D. Luís, e da próxima jornada à cidade, quando Luísa, depois de uma pausa na conversa disse ex abrupto para o marido:
- Ó Tomé, e que dirias tu se um dia a tua filha morasse naquela casa?
E, ao dizer isto, designava com a cabeça a Casa Mourisca.
Tomé olhou para a mulher, como se aquelas palavras lhe fizessem duvidar da firmeza do juízo dela.
- Que queres tu dizer com isso?
- Ora! isto de rapazes e raparigas... quando se vêem a miúdo...
Tomé corou, exclamando com mau modo:
- Tu estás doida, Luísa?
- Ora adeus! Quem sabe lá?
- Ó mulher, não queiras que eu perca a confiança que sempre tive no teu bom juízo.
- Eu não digo... mas enfim...
- Ora adeus, adeus! - atalhou Tomé, quase agastado - há certas coisas que nem a brincar se dizem.
- Pois que mal havia?
- Mau! Ó Luísa, peço-te por favor que te não ponhas com essas graças. Ora para o que te havia de dar!
- Então, porquê?...
- Ora, porque não. Há certas lembranças que até me envergonho de pensar nelas.
Luísa, em vista da repugnância do marido, não ousou insistir. Mas a pobre mulher, com as ambições de mãe, já não podia deixar de olhar a Casa Mourisca e imaginar o efeito que produziria a sua Berta em uma das balaustradas ou das ogivas daquele antigo edifício.