Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 32: XXXII Pág. 442 / 519

Com instintiva repugnância deitou-se outra vez.

Quando no decurso duma noite nos luz assim de súbito uma ideia, em busca da qual andávamos havia muito, quando nos ocorre a solução de um problema em que meditávamos, impacienta-nos o imperturbável silêncio e quietação que nos rodeia, formando tão completo contraste com o tumulto que nos vai no pensamento. Ansiamos pelo dia para ter a quem comunicar a descoberta, e para a examinar à luz bem clara, e desenganarmo-nos de que não fomos vítimas de uma ilusão nocturna.

Enquanto o dia não rompe, o cérebro é irritado por aquela sua criação, como o seio materno pelo ser desenvolvido; acabado o período da gestação mental, é necessário que a ideia venha à luz, e qualquer demora é aflitiva.

Este fenómeno psicológico passava-se em Clemente. Custou-lhe respeitar o sono da mãe, esperando a luz do dia para lhe transmitir a descoberta que fizera.

O resto da noite passou-o volvendo-se e revolvendo-se na cama sem poder dormir. Era quase um estado febril o seu.

Incomodara-o a ideia de que a sua pretensão à aliança com Berta era o motivo da tristeza de Jorge, e que, sem o saber, fora ele o importuno despertador daquele sonho em que se embalavam ambos, deixando-se amar, sem pensarem no futuro do amor a que cediam. Sonho irrealizável embora, porém, Clemente não quereria ter sido quem os acordou.

Antemanhã, quando ainda a estrela de alva despedia próxima do horizonte as suas últimas cintilações, Clemente deixou finalmente o leito, onde não encontrara repouso, e foi passear para o campo contíguo à casa, aguardando o despertar da mãe.

Ana do Vedor era matinal, e por isso Clemente não esperou muito.

Efectivamente a vidraça do quarto em que dormia a robusta matrona abriu-se e ela bradou





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