Às vezes é útil até certa irritação provocada pelas dificuldades fastidiosas que ele suscita; instigam, estimulam brios para vencê-lo.
Continuaram os dois irmãos este diálogo e assentaram enfim na resolução de mudar de vida, cada um com o grau de firmeza própria do seu carácter - e, portanto, com firmeza desigual. Decidiram falar naquele mesmo momento a D. Luís.
A ocasião era propícia. Frei Januário dormia ainda a sesta e portanto o fidalgo devia estar só no seu quarto.
Era já noite. O luar coloria com tintas mágicas a paisagem fronteira à Casa Mourisca. Esta desenhava o seu vulto negro sobre o fundo azul-pálido do céu sem estrelas. A ramaria dos carvalhos e a queda da água nas fontes levantavam vozes melancólicas do meio das indistintas sombras da quinta.
Em noites assim conservava-se D. Luís longo tempo à janela do quarto. A fronte encostada à mão, os olhos fitos nos pontos iluminados da perspectiva, e o pensamento... ai, quem sabe por que melancólicas paragens andava o pensamento do pobre velho?! Passadas magnificências, festas, alegrias e triunfos de tempos mais felizes, memórias de vida nesta habitação hoje silenciosa, e por toda a parte, e sempre, a pálida imagem da filha morta, o enlevo de toda a sua vida, que ao desaparecer lha deixou escura e desencantada... que outras podiam ser as visões presentes àquele espírito sombrio?
Pobre velho!
Foi para este quarto escuro que se dirigiram os dois irmãos.