Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 8: VIII Pág. 90 / 519

Gozava, mas sem embriaguez; sentia, mas sem arroubamentos; e, apreciando as prendas de educação que ia adquirindo, nunca perdia de vista a modéstia do seu nascimento e a modéstia do futuro que naturalmente devia ser o seu. Se tinha sonhos de juventude… e quem os não tem naquela idade? sabia que sonhava e não se distraía a procurar no mundo real as visões que neles lhe apareciam.

A lembrança da sua origem modesta não a fazia melancólica, mas prudente. Não era aquela ideia uma sombra negra, que não lhe deixava ver a luz; simplesmente um como cristal corado, que lhe permitia fitá-la, sem medo de ofuscação e cegueira.

Assim, no meio das suas efusões, das suas melancolias e até dos seus pequenos caprichos de rapariga, Berta nunca deixava de ser uma rapariga de juízo.

A educação do colégio não produzira nela a adocicada pedantaria de algumas meninas da moda. Nas cartas que escrevia aos pais nunca se lia uma frase que eles não entendessem, uma palavra que os embaraçasse e lhes fizesse sentir a inferioridade da sua educação. Revelava-se nisto um natural instinto de delicadeza, que Tomé, por um instinto análogo, sabia apreciar.

Sentia que Berta nunca se envergonharia de chamar a ele pai e mãe à boa Luísa, e esta convicção não o deixava arrepender de a haver educado com esmero. Pobre do homem se esses cuidados lhe tivessem alienado os afectos da rapariga!

As cartas de Berta eram escritas de forma que não somente aos pais agradavam, mas a quantos as liam.

Tomé mostrara-as a Jorge, e este não pôde deixar de apreciar a redacção singela e despretensiosa em que parecia reflectir-se a candura e pureza daquele carácter de mulher. Havia nelas uma maneira de pensar tão acertada, vistas tão despidas de preconceitos, tanto sentimento





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