Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 16: XVI Pág. 205 / 519

A seu tempo cairão as cataratas.

- Já digo, eu não acredito.

- Pois Nosso Senhor te dê sempre essa cómoda incredulidade; antes de casar e depois de casar.

E entre os três ficou pactuada para aquela noite uma espionagem cerrada à casa de Tomé, com o fim de reconhecerem a misteriosa visita.

Maurício passou o dia todo pensativo e preocupado com a revelação que os primos lhe fizeram.

Ainda quando Berta não tivesse adquirido grande preponderância sobre os pensamentos de Maurício, bastaria a ideia de que o outro o preferira no coração de uma mulher, a quem ele havia dedicado um olhar de galanteio, para deveras o irritar.

Mas, de justiça é que se diga, o amor, a paixão, a inclinação, o capricho ou como mais rigoroso nome tenha, o sentimento de Maurício para Berta atingira a máxima intensidade a que podiam subir os afectos daquele carácter volúvel. Senão amava ainda deveras, é certo também que nunca amara melhor. Berta, demais, possuía sobre as outras mulheres que nas épocas sucessivas haviam reinado na imaginação deste rapaz o prestígio das recordações de infância, a distinção de trato adquirida na educação da cidade, e até a desafectada reserva com que lhe tinha acolhido o galanteio.

As reflexões de Jorge contra aqueles amores, a perspectiva das repugnâncias de família, dos obstáculos a vencer, dos preconceitos e paixões com que lutar, longe de extinguirem a chama em que ele procurava abrasar-se, antes mais a activavam.

A ideia de um amor entre dois corações jovens, amor constante em despeito do antagonismo, das animadversões e dos ódios das famílias; esse eterno e poético tema de tantas obras de arte era simpático à fantasia de Maurício, que, seduzido por ela, chegou a convencer-se de que estava destinado a ser mais um exemplo do caso; estímulo suficiente para o apaixonar.





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