- Maurício ficou outra vez silencioso; depois como se pretendesse sacudir de si as ideias negras evocadas pelas palavras do irmão, exclamou, erguendo-se e com afectado estouvamento.
- Estás enganado, Jorge, o que reina ali em baixo não é a poesia, é… é… é a economia. A poesia não assiste ao edifício que se levanta, mas ao que se arruína; gosta mais dos musgos do que da cal; do lado do passado é que a encontras, melancólica, que é o ar que lhe convém. E ela tem razão; o futuro tem muita vida para precisar do prestígio poético. A poesia dos utilitários! Com o que tu me vens! Não sei quem foi que há tempos me disse ter lido uma notícia curiosa a respeito da Inglaterra. Parece que o espírito industrial e económico daquela gente vai lá destruindo as florestas, as matas, as sebes vivas, o que emudecerá dentro em pouco os coros das aves; os rebanhos, que dantes pastavam pelas campinas verdes, hoje já prosaicamente se vão engordando nos estábulos! Que mais falta? A voz dos camponeses, as cantigas e as músicas rurais hão-de calar-se ao ruído do ranger das máquinas e do silvo do vapor. Admirável! Em vez do fumo alvo e ténue das choças, ficará o céu coberto de fumo negro e espesso do carvão de pedra. Que modelo de aldeia o que nos vem de Inglaterra! Na verdade! Que poesia!
- No que tu me vens falar! Na Inglaterra agrícola! - acudiu Jorge. - Mas antes lá é que bem se compreende a poesia da vida rural, que até a nobreza a não despreza. Sempre ouvi dizer que os senhores das terras e os rendeiros fraternizam e auxiliam-se mutuamente, e que os trabalhos do ano sucedem-se entre festas e solenidades populares, lucrando todos, trabalhando todos e enriquecendo cada vez mais a terra.