- Então V. Ex.ª quer ir a pé até à baixa do Paul?! - perguntou o padre assustado.
- Vou.
- Mas... é um estirão e...
- Então que fazes? Parte - disse D. Luís com impaciência para o criado, e este obedeceu-lhe prontamente.
O padre ficou a resmonear:
- Eu cada vez ando mais às aranhas com a gente desta casa. Sempre tenho visto e ouvido coisas há tempos a esta parte! Olhem que preparos estes! Havemos de cear a boas horas, não tem dúvida nenhuma!
- Agora feche a porta, frei Januário - ordenou D. Luís.
O padre tomou com ambas as mãos a enorme chave do portão, e fê-la girar na fechadura.
Este movimento produziu um som agudo, semelhante ao gemido de uma ave, o qual ressoou tristemente pelo interior daquela casa deserta.
O padre tirou a chave, que juntou ao molho que trazia, deu um encontrão à porta, para verificar se ela estaria bem fechada, e depois olhou para D. Luís.
- Vamos - disse este.
O padre ia pôr-se a caminho, mas parou, vendo o fidalgo seguir a direcção oposta à da Quinta dos Bacelos.
- V. Ex.ª por onde vai?
- Por aqui - respondeu secamente o fidalgo, continuando a andar.
- Mas... V. Ex.ª está enganado. Esse não é o caminho.
- Bem sei.
O padre seguiu, murmurando contra as venetas do fidalgo:
- Esta cabeça já não regula direita. Onde diabo quer ir este homem?
O caminho que D. Luís continuava a seguir era tão divergente do que o padre esperava, que outra vez o interpelou:
- Mas V. Ex.ª onde quer ir?
- A casa do Tomé da Póvoa - respondeu D. Luís, e acrescentou:
- E advirto-lhe, frei Januário, que não me sinto com disposição para conversar.
O padre sabia que sempre que D. Luís fazia certas observações, em certo tom e com certa inflexão de voz, era inútil e imprudente contrariá-lo.