Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 21: XXI Pág. 297 / 519

- E se voltar a interrogar-me - pensava Jorge - que posso eu dizer-lhe? que devo confessar-lhe? - Nada. Pois que tenho eu contra ela? Pobre rapariga! Mas é certo que me parece que tenho sido um tanto rude, um tanto desabrido... E porquê?

Jorge parecia neste momento estar sondando o fundo do seu próprio coração, para investigar a verdade. De repente fez um movimento com a cabeça, como tentando rejeitar uma ideia pertinaz.

- Mas isto não pode ser, Senhor. Isto é uma loucura que não tem razão de existir. Pois não hei-de ter força de a abafar à nascença? Acaso o sangue de minha idade também me há-de fazer doidejar como aos outros? Eu felizmente não possuo o temperamento de Maurício e hei-de vencer na luta, hei-de. Mas em todo o caso é uma puerilidade, a maneira por que estou procedendo com Berta. Porque é certo que o modo por que a trato não é natural. É medo de me trair? Mais me traio ainda por esta forma. É despeito por as atenções que a vejo dar a outro?... a meu irmão?! Mas é uma vileza da minha parte... A meu irmão?! É verdade que se ele amasse deveras... mas eu que o conheço... É uma loucura afinal, é o que é. E fiem-se no juízo de um rapaz de vinte anos! Aí estou eu tão doido como qualquer desses estouvados. E o mais é que a mim é que se não perdoaria a loucura. A loucura em um rapaz de juízo é um delito imperdoável. Se soubessem por aí... se descobrissem... «E quem devia dizer! Ora vejam, um rapaz que parecia tão ajuizado!» É como eles principiam logo. Ai, tem pesadas responsabilidades o que na minha idade mereceu que lhe chamassem «um rapaz de juízo». É preciso a cada momento sufocar a revolta do temperamento e da idade, lutar incessantemente com a imaginação... E hei-de lutar! É forçoso que não deixe sair cá de dentro os meus desvarios de rapaz.





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