Berta parou, surpreendida e intimidada por aquela súbita transformação nas maneiras do padrinho para com ela, e, ao sair do quarto, saltavam-lhe de sentida as lágrimas dos olhos.
- Ó fidalgo! - acudiu a Ana do Vedor, cada vez mais assustada pelo estado em que o via - ó fidalgo! olhe que está fora de si! Isto que é? A pobre rapariga vai a chorar por a maneira por que a tratou. Que culpa tem ela? Coitada da pobre!
- É o que lucra quem se aproxima de um homem maldito de Deus como eu sou - respondeu o velho, deixando-se cair na cadeira já desalentado.
- Não diga essas coisas, que até é pecado! Que motivos tem para essas fúrias! Olha agora! O que eu lhe disse não é para tanto. Além de que, sossegue, tanto a rapariga como o seu filho têm juízo, mais até do que lhes convinha para serem felizes. Digo-lhe eu que mais depressa eles se deixarão morrer, e até parece que estão nessa resolução, do que lhe darão o desgosto de que tanto se receia, não sei porquê. E olhe que o rapaz já não está longe de fazer a tal viagem. A não lhe agradar mais vê-lo morrer, o que o fidalgo deve fazer é...
D. Luís mostrava não dar a menor atenção ao que a mulher dizia. O acesso de desespero passara. Com gesto e voz de abatimento interrompeu-a perguntando:
- A pequena ia deveras a chorar?
- Pudera não. Ao rompante com que V. Ex.ª lhe falou! E sem razão alguma, porque, como eu disse a V. Ex.ª, eles...
O fidalgo suspirou:
- É uma fatalidade! - disse ele a meia voz. - Pobre rapariga! Decerto que não é ela culpada nisto. Instrumento inocente nas mãos dos outros, nem ela sabe o que faz! Ana, eu preciso de estar só, peço-lhe que me deixe só.
- Pois fique-se com Deus.