Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 26: XXVI Pág. 360 / 519

A ordem veio e redigida em termos severos para o honesto rapaz, a quem se recomendava mais tino e cordura no desempenho das suas obrigações.

Os apaniguados dos fidalgos, parasitas que ainda se nutriam da seiva quase exausta daquela carcomida árvore genealógica, clamaram contra o atentado do regedor e chegaram a ameaçar-lhe a existência, fazendo-lhe esperas nocturnas. Mas, o que mais é ainda, o povo, os pobres, os oprimidos, os esmagados de ontem, esses mesmos, quase levaram a mal ao regedor a falta de atenção que tivera para com os fidalgos. Transtornar uma regra social estabelecida, embora seja para bem, escandaliza sempre os fanáticos da ordem; e há-os tão fervorosos, que a adoram, ainda quando ela revista a feição moscovita.

A taça transbordou para Clemente. Pediu terminantemente a sua demissão e foi-lhe concedida, com muita facilidade, por as eleições estarem próximas, e serem em regra incómodos empecilhos estes caracteres amigos do justo para o andamento da máquina administrativa, quando empregada na grande tarefa de cunhar deputados com a efígie governamental.

Com grande júbilo celebrou Ana do Vedor a resolução do filho. Havia muito tempo que ela aconselhava aquele passo.

- Que precisão tens tu, Clemente, de te meteres nestas barafundas? Se não precisas disso para comer, para que hás-de perder o sossego com coisas que te não dão interesse? - pregava ela, inoculando no filho a sua filosofia um tanto egoísta. - Olha, rapaz, a tua casa já dá bem que fazer a um homem. E quem quiser que prenda os ladrões e ande adiante dos cabos em serviço do rei, que tu, graças a Deus, não ficas mais honrado com isso. Inda se essa gente do governo fizesse caso de quem os serve bem, mas tu estás vendo como eles são. Por isso deixa-os; eles que se avenham, que se lá entendem.





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