Um novo incidente, em que tomaram parte os fidalgos do Cruzeiro, principais fautores de todos os atentados no concelho, acabou de decidi-lo.
Vimos em um dos capítulos precedentes que eles protegiam muito às escâncaras a fuga de um refractário ao serviço militar, facto que sobremaneira irritara Clemente, o qual chegou a tentar pôr em prática as medidas extremas que a lei lhe permitia. Encontrou, porém, na autoridade administrativa, que afagou a influência eleitoral dos fidalgos, frouxo apoio, e o refractário conseguiu escapula.
Logo depois de realizada a fuga, Clemente, que a atribuía sobretudo à falta de energia do seu chefe, recebeu deste um ofício censurando-o asperamente pela débil vigilância que tivera no caso e admoestando-o para ser de futuro mais activo e inteligente.
Esta duplicidade indignou o ingénuo rapaz, que resistiu a custo à tentação de ir dizer ao administrador algumas amargas verdades.
Dias depois houve um serão em casa de um lavrador da freguesia, e Clemente recebeu aviso de que os manos do Cruzeiro premeditavam para essa noite umas vinganças contra uns serandeiros com quem mantinham uma rixa antiga.
O regedor, não só por dever do cargo, como pelo desculpável desejo de dar uma severa lição a esses incorrigíveis, causa principal dos seus desgostos, tomou providências, reuniu os cabos e rondou as proximidades da casa do serão.
A precaução policial foi útil, porque evitou alguma desgraça séria. Pela meia-noite os dois irmãos do Cruzeiro saíram ao caminho a um camponês, que recolhia do serão, e atacaram-no com ímpeto que não denunciava um propósito inocente.
O regedor caiu porém sobre eles, e a muito custo conseguiu capturá-los, jurando que somente os soltaria à ordem expressa da autoridade superior.