Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 6: VI Pág. 64 / 519

Em cada homem do campo temos um mestre, e as crianças por aí já sabem dizer que os fidalgos da Casa Mourisca estão empenhados.

D. Luís, a estas palavras, estremeceu, como ao contacto de um ferro candente; virou-se irritado para Jorge, falando quase a custo:

- No meu tempo pagavam-se essas lições bem caras! Para isso serviam então, pelo menos, os rapazes das nossas famílias.

- Também nós as pagaríamos, senhor; mas, voltando a casa, dir-nos-ia a consciência que não ficavam assim saldadas todas as dívidas. O orgulho e a vingança estariam satisfeitos; mas a razão e o dever, não - contestou-lhe Jorge.

- Então queiram dizer-me o que lhes manda a razão e... e o que mais?... Ah, sim... e mais o dever.

Jorge, sem se perturbar, acudiu:

- Mandam-nos trabalhar para remir essas dívidas, lutar pela integridade desses bens, que são nossa herança, aumentá-los antes, se for possível; mandam-nos manter em respeito essa gente que nos olha com atrevimento, destruindo para isso os fundamentos da sua insolência. A razão, meu pai, diz-nos que é uma vergonha e um crime para os nossos vinte anos a vida ociosa e inútil que passamos aqui.

- Muito bem; querem então meus filhos que eu lhes dê um modo de vida; vêm aqui no propósito de arguir-me por me ter descuidado de os... arrumar?

O fidalgo empregou no verbo final, de um sabor burguês, toda a ênfase sarcástica que lhe inspiravam a sua irritação e orgulho aristocrático.

- Não, meu pai - insistiu Jorge - , vimos apenas lembrar a V. Ex.ª que chegamos a uma idade em que já nos não satisfazem os gozos da vida de rapaz, de que o muito amor de V. Ex.ª nos tem permitido saciar. Vimos pedir-lhe que nos conceda agora licença de nos ocuparmos de outra ordem de ideias e de mudarmos de vida. Sentimos despontar em nós desejos novos, vimos respeitosamente anunciá-lo a V.





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