Os Fidalgos da Casa Mourisca - Cap. 16: XVI Pág. 208 / 519

- Ah! O Jorge falou-te nisso?

- Há dias. Pelos modos o Tomé queixou-se-lhe...

- Ai, o Tomé queixou-se ao Jorge? Sim, senhor, tem graça. Que te parece, ó Lourenço?

- É bem bom! E então o Jorge deu-te conselhos, hem?

- Sim, disse-me alguma coisa; que era preciso cautela, que não era prudente o meu proceder...

- Ah!

- E quase me fez prometer que desistiria.

- Ah! fez-te prometer isso?

- Quase...

Os dois não podiam suster o riso.

- É impagável aquele Jorge! - repetia de quando em quando o padre.

- Vocês bem sabem o génio dele.

- Ai sabemos. Pois nós bem sabemos... o génio dele. Ah! Ah!...

E os risos redobravam.

Mas a noite chegara enfim e encerraram-se cada vez mais as sombras sobre os caminhos do campo. Maurício pôde finalmente acompanhar os primos ao lugar da espia.

Dirigiram-se ali por sítios menos frequentados, e sem soltarem uma palavra.

Maurício, a seu pesar, sentia-se dominado por uma comoção profunda. Não era só despeito, era já uma nascente de repugnância pelo acto que praticava. Envergonhava-se daquele furtivo mister de espião.

Chegados ao local, o padre escolheu a posição de maneira que pudessem ver sem serem vistos.

Por muito tempo nada descobriram; nem ouviram mais algum som além do melancólico gemer dos sapos, a distância.

Maurício, entre impaciente e satisfeito pelo resultado nulo da espionagem, principiava a dirigir aos primos alguns ditos epigramáticos, quando a mão do doutor lhe tapou a boca, ao mesmo tempo que o padre se voltava para lhe recomendar silêncio.

Efectivamente, encostado ao muro da Herdade, caminhava um homem, que a sombra da noite não deixava conhecer.

Chegando à porta, que devia estar apenas cerrada, empurrou-a e fechou-a de novo sem fazer ruído.





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