A abolição dos morgados e vínculos, definitivamente decretada poucos anos antes, fornecia farto alimento para aquelas jeremiadas; os dissipadores fidalgos, que tinham arriscado o futuro e bem-estar dos filhos, desbaratando-lhes a legítima com a sua imprevidência e prodigalidade, lançavam agora à conta da lei o que era a consequência lógica da sua má administração.
As raparigas falavam umas com as outras de vestidos e de enfeites, e dispunham de quando em quando de algum olhar mais terno para qualquer dos primos presentes, em cujo número se continham os namorados de cada uma ou de mais do que uma. Estas representantes das poéticas e vaporosas castelãs que na meia idade premiavam os campeadores na liça, os guerreiros na volta dos combates, e os menestréis e pajens que lhes endereçavam conceituosos galanteios nos estrados das salas, tinham perdido muito da poesia do tipo primitivo. Vivendo em uma época em que não havia campeões, guerreiros nem trovadores para premiar, limitavam-se as meninas a aceitar a corte dos primos, também muito pouco parecidos com os seus cavaleirosos avós, e, com a maior candura que pode medrar na província, roubavam umas às outras os noivos e os namorados.
Algumas havia ali mais revolucionárias, que tinham conseguido introduzir o piano em casa e com ele as músicas da moda, obtendo uma outra vez dos pais a concessão de dar uma partida, onde a nata da nobreza provinciana dançava os Lanceiros como qualquer sociedade de artistas.
Os rapazes reunidos no terraço fumavam e atiravam o revólver aos troncos das árvores ou às avezitas que poisavam nos ramos.
A maioria, ou morgados ou filhos segundos, era de ignorantes e vadios: se alguns haviam descido até ao ponto de irem a Coimbra fazerem à ciência a honra de estudar, poucos desses mostravam as habilitações adquiridas exercendo qualquer mister social.