O jantar não desdizia do puritanismo daquela sociedade.
Era um jantar à portuguesa e digno de portugueses, que não querem nostrum regnum ire fore de Portucalensibus.
A Casa Mourisca, bem explorada, ainda deu para ostentar um esplendor que, se nada era em comparação com o dos magníficos festins que em tempos passados a animaram, não envergonhava o seu brasão perante os fidalgos presentes, que, pela maior parte, o tinham tanto ou mais deteriorado.
Os criados supriram com diligência o número, de modo que o serviço correu regular.
Enquanto se servia a sopa e não se havia encetado as libações, reinou na sala aquele silêncio momentâneo próprio da ocasião.
Só se ouve o tocar das colheres nos pratos e o sorvo mais ruidoso de alguns convivas que se não constrangem. O apetite satisfaz-se, dão-se tréguas às conversas. Depois retiram-se os primeiros pratos, enchem-se os copos, repousam os comensais, e de vizinho para vizinho tratava-se a meia voz um diálogo cortado, sobre assuntos insignificantes. Depois o tinir das louças e dos cristais, o vapor oloroso das iguarias, os efeitos excitantes dos vinhos animam o espírito; o tom das conversas eleva-se, o vizinho fronteiro intervém, cresce a confusão, os risos misturam-se com as palavras, a timidez dissipa-se, cada qual sente-se com um arrojo que desconhece, vencem-se reservas e resistências que pareciam insuperáveis, reina a vida na sala do banquete.
Por estas diversas e sucessivas fases passou o jantar em casa de D. Luís. No meio dele, berrava-se política ali, jogavam-se epigramas acolá, segredavam-se requebros em outro ponto, e dava-se largas à maledicência em quase todos.
Jorge conservara-se sério e reservado, como estivera toda a manhã.
Maurício fazia esforços para mostrar-se despreocupado, porém mal o conseguia.