A paixão ensurdecia ainda muito D. Luís, para que lhe fosse possível escutar conselhos.
Na manhã imediata à noite da instalação solene da família de D. Luís na casa dos Bacelos, Gabriela foi procurar Jorge ao pavilhão no fundo da quinta, onde ele desde a véspera se alojara, longe dos olhares paternos.
A baronesa tinha sabido de frei Januário tudo o que se passara entre D. Luís e Berta à porta da quinta de Tomé, e desejava falar nisto ao primo.
Jorge recebeu-a com umas aparências de serenidade que não eram de todo sinceras.
- E meu pai? - foi a primeira pergunta de Jorge, depois das palavras de cumprimento.
- Um pouco menos afrontado, depois que realizou uma ideia cavalheirosa e vindicou, como entendeu, a sua dignidade aristocrática.
- Pois que fez ele?
- Foi entregar pessoalmente as chaves da Casa Mourisca nas mãos de Tomé da Póvoa. O frei Januário contou-me tudo. A aristocracia é assim em toda a parte. Tem a cabeça cheia de tradições da Idade Média e por elas se regula. Procura sempre dar às suas acções uma feição dramática, e, sempre que o consegue, sai desoprimida de qualquer situação apertada.
- E Tomé aceitou-as?
- O Tomé não estava em casa. A entrevista teve lugar à porta da Herdade entre o tio Luís e Berta, a heroína de toda esta história; e a propósito...
- Perdão, mas... o que se passou nessa entrevista?
- Pelo que me disse o padre, correu muito sentimental ao princípio. A vista de Berta recordou ao tio a imagem de Beatriz e comoveu-o a ponto de chorar. A rapariga parece que lhe disse algumas coisas ternas, que acabaram de o sensibilizar; abençoou-a, beijou-a e quase se ia esquecendo do que o levara ali, mas de repente recordou-se e fez a entrega das chaves com uma gravidade igual à de Martim de Freitas, cuja vaga recordação foi o que provavelmente lhe sugeriu a ideia da cena.